Iane Gonzaga lança ‘Como Você’; single celebra romance quente entre mulheres pretas

Iane Gonzaga lança ‘Como Você’; single celebra romance quente entre mulheres pretas

A cantora, musicista e compositora Iane Gonzaga é sensível e abraça a característica como uma virtude.

“Às vezes é uma coisa que a gente não quer falar porque acha que remete à fragilidade. Mas não. A sensibilidade também carrega muita força”, declara ela. Iane lançou o single ‘Como Você’ na última sexta-feira (4), terceira a ser liberada para o público pela plataforma Novíssimos Labs. A faixa tem lançamento pelo selo Coliga Produções (@coligaproducoes).

‘Como Você’ é o nome da canção “safadinha”, avisa Iane. “Eu vou falar dessa troca afetiva mais quente e do fogo sexual, mas usando outras palavras. Não estou sendo explícita, vou sob outros códigos de linguagem. Para bom entendedor…”, brinca a artista. Em agosto, mês em que se comemora o Dia Nacional da Visibilidade Lésbica, a canção retrata o romance entre duas mulheres pretas.

Nos versos e nas cenas do visualizer, que acompanha a faixa, está o cotidiano da vida em casal. Iane passeia, com seus acordes de afrobeat e samba-reggae, pela rotina de duas mulheres que trocam gestos de amor, incentivo e cumplicidade. “Vai desde o prazer em acordar juntas até a saudade que vem com a correria do trabalho”, narra ela.

Iane canta, na maior parte das vezes, para plateias repletas de mulheres. Isso se deve à sua participação ativa em movimentos político-sociais, como “‘coletivas’ pensadas para o bem-estar dos corpos de mulheres pretas e sapatão”, esmiúça a cantora, que também fez parte de comunidades musicais.

“É uma música que fala de amor, que exalta o amor entre mulheres, principalmente entre mulheres pretas. Nessa caminhada, sob essa questão racial onde o amor nos é negado, onde a mulher preta não tem direito ao afeto. É ela quem sempre dá o afeto. Eu penso em ressignificar os sentimentos de amor e de afeto entre esses corpos”, complementa Iane.

O cruzamento das cordas com a percussão marcada, inspirada nos blocos afro – que, no ano que vem, completam 50 anos de fundação – têm arranjos que bebem da fonte do maestro Letieres Leite, frisa Iane. “Eu enxergo esse trabalho como um vetor de força do aquilombamento na música baiana”, aponta a cantora.

‘Como Você’, aliás, une talentos da música baiana em um time formado por musicistas e músicos negros, em sua maioria periféricos. Felipe Guedes na bateria e trompete; Lucas Maciel na percussão; Riane Mascarenhas no baixo; Jordi Amorim nos teclados, violão, guitarra, programações, arranjo, captação e mixagem; e Richard Meyer na captação e masterização.

A vertente musical de Iane foi herdada. Ela, que acompanhava o pai em rodas de samba improvisados com os amigos, revela um frisson que sempre se aflorou ao estar cara a cara com instrumentos musicais. “Sempre curiosa”, “aquela criança chata”, como ela mesma se definiu, Iane tomou gosto pelos instrumentos que teimava em tentar mexer, ainda que fosse frequentemente advertida pelos adultos, receosos de que a pequena pudesse danificá-los. Já se acendia ali uma seta que apontava para o seu ofício de artista da música.
“Eu me senti instigada porque meu pai – e de outras duas filhas –, apesar de não ser músico, tinha um grupo de amigos que toda vez que se encontravam faziam um sambinha. Era o lazer dele. Ele levava a mim e as minhas irmãs onde o samba tocava: na praia, no barzinho ou quando era aniversário de alguém”, ilustra a artista.
E acrescenta: “A partir dali, começo a entender a minha atração pela música e pelo instrumental, que se iniciou por essa curiosidade de criança”. Passaram-se anos. Crescida e prestes a se formar no ensino médio, teve a inclinação musical percebida pela avó, que a presenteou com um violão. “Eu ficava sempre pedindo emprestado o violão para os amigos e minha mãe não gostava”, confidencia Iane.
Antes do violão, já havia chegado a vez do teclado e outros instrumentos, pois, afirma Iane, os pais a incentivavam bastante. “Foi quando eu comecei a estudar violão. Fui fazer um curso de violão popular, na Ufba. Saía do colégio e ia”, conta Iane.

A cantora comenta que foi frequentando as aulas que fez amigos, com quem criou bandas e projetos. Iane conta que os esforços não deram tão certo, mas reconhece que, até aqui, foi longe e não pretende parar. “Muita coisa foi passando até eu chegar a estar aqui, participando do Novíssimos Labs”, analisa.

Equipe 100% preta e periférica
O visualizer tem produção executiva da Coliga Produções, comandada por Camila Brito, e produção audiovisual da Nilo Entretenimento. A Nilo é uma produtora que, assim como Iane, tem raízes no Engenho Velho da Federação, bairro de Salvador que talvez abrigue a maior concentração de terreiros de candomblé na cidade, além da mais antiga casa de axé do Brasil, o Terreiro da Casa Branca, fundado em 1860.

“Da galera que eu conheço, do terreiro, tem muitos músicos. E eu conheci um grupo de jovens que está começando no [mercado de produção] audiovisual. Antes de eu conhecê-los, eles já tinham fortalecido artistas do território [do Engenho Velho] e de outros territórios”, relata Iane.

Os 25 mil habitantes – ou 80 mil, já que os dados encontrados divergem –, em sua maioria afro-brasileiros, e a forte presença da ancestralidade no Engenho Velho se assentam na escolha de Iane por formar uma equipe técnica composta 100% por gente preta e periférica.
Ela também realça algumas parcerias musicais que foram eternizadas, em 2021, na gravação do seu primeiro EP, ‘Territóriamente’. A produção musical do músico e arranjador Jordi Amorim e a participação de Felipe Guedes na bateria, percussão e sopros; a clarinetista Daniela Natáli; e a baixista Riane Mascarenhas. O compacto foi contemplado pelo Programa Aldir Blanc Bahia através da Secretaria de Cultura e da Fundação Cultural do Estado da Bahia.


Fotos Átila Santana


Ficha técnica
Voz: Iane Gonzaga
Letra: Iane Gonzaga
Bateria e trompete: Felipe Guedes
Percussão: Lucas Maciel
Baixo: Riane Mascarenhas
Teclado, violão, guitarra, programações, arranjo, captação e mixagem: Jordi Amorim Captação e masterização Richard Meyer